Técnica evoluiu do desenho feito à mão para edição de imagens em computador. Retratista junta partes do rosto até obter imagem do suspeito.
Por Marília Marques, G1 DF
Papiloscopista da Polícia Civil do DF faz retrato falado em desfio porposto pelo G1 |
Como em um quebra-cabeça, peça a peça, o papiloscopista constroi o retrato falado do possível autor de um crime. A técnica exige muito mais do que a habilidade de desenho e inclui, por exemplo, a psicologia para extrair os detalhes da fisionomia gravados nas mentes abaladas das vítimas.
Maria Doraci da Silva é uma das seis profissionais da Polícia Civil do Distrito Federal com a missão de traçar contornos bem feitos, e, assim, materializar a descrição de vítimas e testemunhas. Ela contou ao G1 que, apesar de ser formada em economia, atua na área de identificação há nove anos.
"O retrato falado não é uma fotografia, é uma imagem que tem semelhança fisionômica com o autor do crime e tem o objetivo de auxiliar nas investigações."
Na sala em que trabalha, as paredes brancas e o ambiente decorado com arranjo de flores – no andar superior do Departamento de Polícia Especializada (DPE) – ajudam a estimular as memórias de quem foi vítima de um roubo ou estupro, por exemplo.
Papiloscopista da PCDF Maria Doraci da Silva mostra o passo a passo de um retrato falado (Foto: Marília Marques/G1) |
Passo a passo
O primeiro passo é ouvir de uma forma geral as principais descrições do suspeito, como estatura, cor da pele e faixa de idade. Aqui, também entra a característica mais marcante do rosto, como uma cicatriz, barba ou acessório.
Em seguida, a papiloscopista questiona detalhes como textura do cabelo, formato dos olhos, tipo de sobrancelha, desenho do nariz e boca. As opções vão de lábios mais finos aos carnudos.
"Nem sempre a vítima tem todas essas informações, porque ficou com os olhos voltados para arma, por exemplo, ou até porque não é muito detalhista", conta Maria Doraci.
"Nesses casos, dá para usar um nariz padrão, compatível com a cor da pele do suspeito. Mas a descrição dos olhos, por exemplo, é fundamental."
Todo o processo leva, em média, duas horas para ser concluído. A estratégia envolve fazer e desfazer algumas das 25 mil combinações de traços disponíveis no banco de imagens da Polícia Civil do DF.
As referências são fotografias de partes do corpo de qualquer pessoa que tenha sido identificada pela polícia como autora de um crime.
Papiloscopista usa banco de dados da PCDF para montar retrato falado de suspeito (Foto: Marília Marques/G1) |
Desafio
Sabendo das principais características do suspeito, com a ajuda de um programa comum de edição de imagem, o rosto da pessoa procurada começa a "ganhar vida". Olhos, boca e nariz – chamados de "triângulo da face" são ajustados conforme cada lembrança que vem à tona.
Como desafio à profissional, o G1 propôs que a papiloscopista, sem saber que se tratava da descrição de alguém famoso, ouvisse a descrição das características do ex-beatle John Lennon. Passo a passo, Maria Doraci construiu o retrato falado de um dos maiores astros da música (veja vídeo no topo da reportagem).
Imagem do ex-Beatle John Lennon é construída em 'retrato falado' da PCDF (Foto: Marília Marques/G1) |
A dificuldade neste caso, foi encontrar a textura de cabelo que fosse condizente com a do músico, já que o banco de imagens da Polícia Civil do DF usa, em sua maioria, traços mais comuns à região.
A proposta, no entanto, segundo Maria, não é chegar ao perfil exato do criminoso, mas permitir que a polícia elimine suspeitos com características divergentes do retratado e também que demais testemunhas possam identificar a pessoa, em caso de reincidência do crime.
Ajuda da tecnologia
Quando a técnica do retrato falado começou a ser usada no DF, o profissional da identificação precisava usar lápis e papel para desenhar o suspeito.
Com a evolução da tecnologia, as técnicas mudaram para uma espécie de decalque sobre transparências de olhos, bocas e nariz. Tempos depois, o retrato começou a ser criado em computador.
Banco de rostos femininos no departamento de identificação da PCDF (Foto: Marília Marques/G1) |
A facilidade de um programa de edição de vídeo no processo ajuda a acelerar o processo e, portanto, reduzir o tempo de relato das vítimas que, muitas vezes, estão sob estresse. O tipo de crime, explica Maria, também influencia nas lembranças de quem depõe.
Em ocorrências de roubo a pedestre, por exemplo, como o tempo da ação é curto, as vítimas costumam registrar menos impressões dos suspeitos.
"Às vezes contam que o autor olhava de um determinado jeito, mas não sabe descrever o formato dos olhos".
Já nos casos de estupro – em que, normalmente, a vítima é forçada a permancer mais tempo na companhia do agressor –, é comum haver mais memórias e detalhes do rosto ou de alguma característica marcante, afirma a especialista.
Fonte - G1/DF